Depois de subir cerca de 150% no varejo doméstico, dominar as redes sociais e virar assunto em mesas de bar, o feijão finalmente começou a dar sinais de que sua escalada arrefeceu. Isso não significa, porém, que a situação voltou ao normal. O alívio vem da entrada no mercado, a partir do fim de julho, da última das três safras da leguminosa da temporada 2015/16.
Nos primeiros dez dias de agosto, o IGP-DI acusou queda de 10,1% dos preços da leguminosa no país. Mas a retração pode ter vida curta, já que a terceira safra também será pequena em razão de problemas climáticos, a exemplo do que aconteceu com as duas anteriores. Resta saber como será o comportamento da demanda – que em julho, diante da alta de 44,6% apontado pelo IGP-DI, já se mostrou mais arredia.
No mês passado, o varejo teve dificuldade para comprar feijão por conta da oferta restrita. E o receio com a demanda fraca também levou o varejo a reduzir as compras. Dados da NeoGrid/Nielsen, coletados em mais de 10 mil lojas em todo o país, apontam que o “índice de ruptura” do feijão nas prateleiras dos supermercados foi de 16,6% em julho, muito superior à média histórica de 4%. Isso significa que a cada 100 itens não encontrados pelo consumidor nas gôndolas, o feijão representou 16,6 no mês passado.
“Diante da instabilidade econômica e dos altos preços, o varejo fica mais cauteloso ao comprar o produto, com receio de que não haja consumo. Assim, o produto acaba faltando nas prateleiras”, afirma Robson Munhoz, diretor de relacionamento com o varejo e indústria da NeoGrid. Nesse contexto, os estoques nos supermercados estão cada vez mais restritos.
Em julho, calcula a NeoGrid, os estoques eram suficientes para 31,13 dias de consumo. Em maio, quando a oferta de segunda safra aumentou, eram 177,16 dias. Mesmo assim, a média de 2016 está em 65,6 dias.
Depois de a primeira e a segunda safras do feijão terem diminuído 8,8% e 24,1% em relação à temporada 2014/15, respectivamente, a colheita da terceira safra, em andamento, deverá alcançar 628,3 mil toneladas, uma queda de 26,1% na mesma comparação, de acordo com estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
Mesmo com a disparada dos preços, que em maio atingiram níveis recorde – a saca de 60 quilos do carioca chegou a R$ 580 -, os produtores investiram menos na área de plantio da terceira safra. Segundo a Conab, foram semeados 543 mil hectares, 16,8% menos que em 2014/15. E a produtividade tende a ser 11,2% mais baixa, daí a forte retração projetada para a produção.
Segundo a Conab, os produtores da Bahia foram os que mais investiram na terceira safra. Semearam 199,5 mil hectares, mas ainda assim houve queda de 6,2%. Isso por causa das preocupações com a má distribuição de chuvas, que pode afetar inclusive a disponibilidade de água para os pivôs de irrigação.
“Desde março temos chuvas irregulares, e o cultivo de feijão nessa época por aqui precisa ser irrigado continuamente”, diz Ernani Sabai, diretor de projetos e pesquisa da Associação dos Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba). Ele explica que o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) do Estado verifica a vazão dos rios periodicamente e não permite que a água seja usada para irrigação quando o nível chega a zero. “Nesse ponto chamamos de “água ecológica”, que só pode ser usada para consumo humano e de animais. E as multas para quem usar sem permissão são pesadas”.
Assim, muitos produtores optaram por plantar em metade de seus pivôs e dividiram a área de feijão com o plantio de sementes de soja e frutas. “Parece claro para quem não conhece o mercado que o preço do feijão seria um atrativo para aumentar a área de plantio. Mas os produtores já foram prejudicados algumas vezes por ciclos de aumento de preços na época do plantio, mas de baixa na colheita”, afirma Sabai. O ciclo de produção do feijão carioca varia de 75 a 90 dias.
O encolhimento da oferta doméstica motivou o aumento das importações. Sobretudo de feijão preto, cuja disponibilidade já é tradicionalmente complementada com produto da Argentina e da China. De janeiro a julho, foram 108 mil toneladas, quase 70% mais que em igual intervalo de 2015. O valor das compras subiu 82%, para US$ 72 milhões. Mas esse aumento não segurou os preços, pois o consumo doméstico gira em torno de 3 milhões de toneladas.